10.3.11

APÓCRIFO DO ENOQUE ESLAVO GANHA NOVA TRADUÇÃO PARA O INGLÊS




Max-Plank-Institut für Wissenschaftsegschichte  disponibilizou uma nova tradução (para o inglês) do segundo livro de Enoque, também conhecido como Enoque eslavo. A tradução foi feita pela Dra Florentina Badalanova GellerO eslavo é o antigo idioma litúrgico da igreja ortodoxa eslava. De acordo com o trabalho da Dra Florentina  (tradução do Numinosum):
A análise linguística do texto de 2 Enoque [...] indica que o texto primitivo [vorlage] pode ter sido escrito com alfabeto glagolítico, e só posteriormente convertido em cirílico (GELLER, Florentina Badalanova, 2 [Slavonic Apocalypse of] Enoch: Text and Context, pg. 8).





O APÓCRIFO DE II ENOQUE, OU ENOQUE ESLAVO (RESUMO)

 Por Jones Mendonça

Publiquei aqui no Numinosum um pequeno trecho o livro de I Enoque, que narra de maneira fantástica o nascimento de Noé e aqueda dos anjos rebeldes.

Outro livro cujo autor utiliza o pseudônimo de Enoque é o Livro dos segredos de Enoque, também conhecido como II Enoque ou Enoque eslavo. Apesar de ter sido escrito em grego, só nos resta uma versão eslava. Este segundo livro relata a viagem de Enoque até o décimo céu, onde “está Deus, [que] na língua hebraica [...] é chamado Aravat” (II En 20,3). A viagem é iniciada após Enoque ser visitado por dois homens “extraordinariamente grandes”, cujas “faces resplandeciam como o sol” e cujos olhos “eram como chama” (II En 1,6). Após despedir-se de sua família, Enoque é inicialmente levado pelos homens ao primeiro céu em suas asas, que eram “mais brilhantes que o ouro” (II En 3). Cada um dos céus possui uma particularidade especial. Seguem abaixo as características principais de cada um deles:

  • 1° céu – Enoque vê os anjos que trabalham na ordenação das estrelas, nos depósitos de neve e na tesouraria do orvalho. O primeiro céu é uma espécie de “casa de máquinas” do mundo, cujos trabalhadores são os anjos (cap. 3-6).
  • 2° céu – Neste local ficam aprisionados os anjos infiéis a Deus, que são torturados e choram incessantemente. O príncipe desses anjos fica acorrentado no quinto céu (cap. 7).
  • 3° céu – No terceiro céu fica o paraíso. Nele há um jardim onde Deus descansa, guardado por trezentos anjos muito brilhantes (cap. 8). O terceiro céu é também para onde vão os “que fazem julgamentos justos, que levam pão aos famintos e que cobrem de vestes os nus” (cap. 9).  O norte deste lugar, escuro e tenebroso, é reservado “aos que desonram a Deus”. É para lá que vão os mentirosos, invejosos, opressores dos pobres e fornicadores (cap. 10).
  • 4° céu – No quarto céu Enoque contempla a órbita do sol (que é aceso por cem anjos), e da lua (cap. 11).  Enoque também vê “outros elementos voadores do céu”, que o acompanham na sua órbita, lhe dando calor e orvalho (cap. 12). Por fim ele fala dos seis “postais do sol”, por onde o grande astro passa ao longo do ano (cap. 13, 14 e 15).  O curso da lua, cheio de detalhes numéricos, é descrito nos capítulos 16 e 17.
  • 5° céu – Soldados gigantes e mudos chamados Grigori são vistos no quinto céu. Juntamente com seu príncipe, Satanail, rejeitaram o Senhor da Luz tomando por esposas as filhas dos homens (este curioso episódio é descrito nos capítulo 6 a 16 do Livro de I Enoque).
  • 6° céu – Neste céu ficam os anjos responsáveis pelas estações do ano, dos rios, dos mares e dos frutos da terra. Eles também são incumbidos de anotar todos os feitos dos homens diante do Senhor (cap. 19).
  • 7° céu – No sétimo céu há uma  grande quantidade de arcanjos, querubins, serafins e toda a sorte de ordens angelicais. É lá que fica o trono de Deus.
  • 8° céu – O oitavo céu é chamado de Muzaloth, o que muda as estações, a seca, a umidade e os doze signos do zodíaco, que estão acima do sétimo céu (cap. 21).
  • 9° céu – É chamado de Kuchavim, onde estão as casas celestes dos doze signos do zodíaco (cap. 21).
  • 10° céu – Chamado de Aravoth, é lá que a face do Senhor pode ser contemplada, descrita como sendo semelhante ao “ferro que arde no fogo e que, as sair, emite faíscas e queima” (cap. 22).
Nos demais capítulos (23 ao o 61), Deus conta a Enoque como criou o universo e lhe transmite uma série de ensinamentos. Enoque retransmite esses ensinamentos aos seus filhos. No último capítulo lemos o seguinte:
Ele [Enoque] anotou todos esses sinais de toda a criação, criada pelo Senhor, e escreveu trezentos e sessenta e seis livros, entregou-os a seus filhos e permaneceu na terra trinta dias, sendo novamente levado para o Céu no sexto dia do mês de Tsivan, no dia e na hora exata em que nascera (En 61,3).
A idéia da existência de dez céus estava profundamente enraizada na cultura judaica. Paulo, por exemplo, diz ter ido ao terceiro céu (2 Co 12,2).

Imagem:
Mignard, Pierre
A Glória Celestial
1663
Afresco
Val-de-Grâce, Paris


O LIVRO APÓCRIFO DE I ENOQUE, OU ENOQUE ETÍOPE (RESUMO)

Por Jones Mendonça

Um dos livros apócrifos mais fascinantes é sem dúvida o livro de I Enoque (ou Enoque etíope), geralmente datado para o século II a.C. Este livro foi redigido originalmente em aramaico, mas a única versão disponível hoje está em etíope. Escrito em linguagem apocalíptica, entre 170 e 64 a.C., o livro carrega algumas semelhanças com o Apocalipse de João, cuja composição se deu mais de dois séculos depois. Abaixo um trecho do livro que descreve o nascimento deNoé:
Depois de alguns dias, meu filho Matusalém escolheu uma mulher para seu filho Lamech; ela engravidou e deu à luz um menino. O seu corpo era branco como a neve e vermelho como uma rosa, os cabelos da sua cabeça eram como a lã e os seus olhos como os raios do sol. Quando abriu os olhos encheu a casa de luz como o sol, e toda ela ficou muito iluminada (I En 106,1).
Outra parte bastante interessante do livro são oscapítulos 6 a 16, que narram a queda dos anjos após desobedecerem a Deus acasalando-se com as mulheres humanas. Tudo começa com Semjaza, um anjo disposto a pagar o preço por sua desobediência. Ele relata seu desejo aos demais anjos, que decidem segui-lo no plano. Semjasa é acompanhado por mais dezoito anjos, que por sua vez chefiam, cada um, outros dez. Após levarem a cabo o plano, problemas inusitados começam a surgir:
Elas [as mulheres humanas] engravidaram e deram à luz a gigantes de 3.000 côvados de altura. Estes consumiram todas as provisões de alimentos dos demais homens. E quando as pessoas nada mais tinham para dar-lhes os gigantes voltaram-se contra elas e começaram a devorá-las (I En 6,2).
Mas os problemas não param por aí. Os anjos rebeldes transmitem seus conhecimentos aos homens, tais como a astrologia, a metalurgia, a ciência da confecção de cosméticos, as fases da lua, a feitiçaria, etc. Tais conhecimentos causam muitas guerras e o homem chega perto da aniquilação.

Após ouvirem o clamor dos homens e virem todas as desgraças causadas pelos anjos rebeldes, MiguelUrielRafael e Gabriel relatam o problema ao “Senhor dos mundos”, que decide purificar a terra com um dilúvio e punir os anjos perversos lançando-os num abismo de fogo.

O livro é fruto de uma tentativa de preencher uma lacuna existente no capítulo seis do livro do Gênesis:
“viram os filhos de Deus (hb. bney haelohim) que as filhas dos homens eram formosas; e tomaram para si mulheres de todas as que escolheram” (Gn 6,2).
No relato do livro de Enoque os bney haelohim (filhos de Deus) são os anjos e a decisão de Deus de destruir a terra (Gn 6,7) é provocada por esse episódio.

Resquícios da história contada neste livro são percebidos na epístola deJudas (Jd 14, s).



Imagem:
Beccafumi, Domenico
Queda dos Anjos Rebeldes
c. 1528
Óleo sobre madeira, 347 x 225 cm
San Niccolò al Carmine, Siena



ONDE BAIXAR APÓCRIFOS NAS LINGUAS ORIGINAIS (GREGO, ÁRABE E LATIM)?

Sempre tive curiosidade pelo conteúdo dos livros apócrifos. Depois de ler muitos textos na internet acabei comprando uma coleção deles (Antigo e Novo Testamento) presentes na seguinte obra:
PROENÇA, Eduardo de (org.). Apócrifos e pseudo-epígrafos da Bíblia. São Paulo: Fonte Editorial, 2005.
 Minha única decepção é que nesta publicação não há nenhuma informação sobre os livros, tais como autoriadata da composiçãocomentários, etc. Outra coisa que não me agradou é que os textos são uma tradução do inglês e eu gostaria algo mais fiel aos originais. De qualquer forma a aquisição valeu a pena. O livro estava numa promoção e saiu por uma ninharia.

Comecei então uma jornada por comentários sobre os apócrifos. Achei quatro (em espanhol):
MACHO, Diez. Apócrifos del Antiguo Testamento.
MARTÍNEZ, F. García; PÉREZ, G. Aranda. Literatura judía intertestamentaria. Estella: Editorial Verbo Divino, 1996.
OTERO, Aurelio de Santos. Los Evangelios Apocrifos. Madrid: Biblioteca de Autores Cristianos, 2005.
VIELHAUER, Philipp. Introducción al Nuevo testamento los apócrifos y los padres apostólicos. Salamanca: Ediciones Sígueme, 1991.
Não satisfeito saí em busca dos manuscritos originais na internet. Digitando palavras chave, tais como "apócrifos/idiomas/originais"; "apócrifos/grego/manuscritos", "apócrifos/latim/manuscritos", etc., não encontrei nada. Tentei as mesmas palavras chave em inglês, espanhol, alemão, francês, italiano... nada!

Finalmente, depois de garimpar muito, acabei encontrando o site de Tony Burke. Ele traz uma lista de links que leva a um site onde é possível baixar trabalhos antigos contendo os apócrifos nos idiomas originais. Alguns deles produzidos pelo linguista Constantin Von Tischendorf, descobridor doCodex Sinaiticus.  Não acreditei no que estava vendo. Mas eu ainda não dei a melhor notícia, as obras são comentadas e gratuitas para baixar já que caíram em domínio público!

Faça um bom proveito:

I. Coleções e Edições (em ordem cronológica)
Fabricius, J. A.  Codex apocryphus Noui Testamenti, vol. 1. Hamburg 1703.


Hone, William. The Apocryphal New Testament. London  1820.

Thilo, J C. Codex apocryphus Novi Testamenti, vol. 1. Leipzig 1832.


TISCHENDORF, Constantin von. De evangeliorum apocryphorum origine et usu. The Hague 1851 (repr. in Synopsis Evangelica, Leipzig 1854).

TISCHENDORF, Constantin von. Acta apostolorum apocrypha. Leipzig 1851.

TISCHENDORF, Constantin von. Apocalypses apocryphae. Leipzig 1851.

Giles, J. A.  Codex Apocryphus Novi Testamenti. The Uncanonical Gospels and Other Writings, Referring to the First Ages of Christianity. Vol. 1. Vol. 2. London 1852.

Tischendorf, Constantin von. Evangelia apocrypha. Leipzig 1853 (2nd ed. 1876).

Migne, J. P. Dictionnaire des Apocryphes. Vol. 1. Vol. 2. Paris 1856-1858.




Wright, W. Apocryphal Acts of the Apostles, Edited from Syriac Manuscripts in the British Museum and Other Libraries. Vol. 1; Vol. 2. London, 1871.

Walker, A. Apocryphal Gospels, Acts and Revelations (The Ante-Nicene Christian Library 16) Edinburgh 1873 (repr. in The Ante-Nicene Fathers, vol. 8, A. CLEVELAND COXE, ed., Buffalo 1806).

Lipsius, R. A. Die apokryphen Apostelgeschichten und Apostellengenden,Vol. 1, Vol. 2.1, Vol. 2.2 Ergänzungsheft. Braunschweig 1883-1890.

Lipsius, R. A. and M. Bonnet. Acta apostolorum apocrypha post Constantin Tischendorf. Leipzig 1891.

James, M. R. Apocrypha anecdota. A Collection of Thirteen Apocryphal Books and Fragments. Cambridge 1893. (featuring Vision of Paul, Acts of Xanthippe and Polyxena, Story of Zosimus, Apocalypse of the Virgin,Apocalypse of Sedrach, Acts of Philip, and a Description of the Anti-Christ in Latin).

Robinson, Forbes. Coptic Apocryphal Gospels. Cambridge 1896 (featuring Transitus Mariae, History of Joseph, and various fragments).

James, M. R. Apocrypha anecdota. Second Series vol. 5. Cambridge 1897.featuring Acts of John, Acts of Thomas, Epistles of Pilate and Herod,Epistle of Tiberius to Pilate).

Gibson, Margaret Dunlop. Apocrypha Siniatica. Cambridge 1896(featuring Anophora Pilati, Recognitions of Clement, Martyrdom of Clement, Preaching of Peter, Martyrdom of James Son of Alphaeus,Preaching of Simon Son of Cleophas, Martyrdom of Simon Son of Alphaeus).

Gibson, Margaret Dunlop. Apocrypha arabica. Cambridge 1901 (featuringKitab al Magall or the Book of the Rolls, Story of Aphikia, and Cyprian and Justin).




Budge, E. A. Wallis. Coptic Apocrypha in the Dialect of Upper Egypt. Oxford 1913 (featuring the Book of the Resurrection by Bartholomew, the Life of Bartholomew, Repose of John, Mysteries of John, and Life of Bishop Pisentius by John the Elder).

Budge, E. A. Wallis. Coptic Martyrdoms in the Dialect of Upper Egypt.London, 1914.


II. Estudos gerais
Butler, Samuel. The Genuine and Apocryphal Gospels Compared. Shrewsbury 1822.
Donehoo, J. D.  The Apocryphal and Legendary Life of Christ. London 1903.

Haase, F. Apostel und Evangelisten in den orientalischen Überlieferungen.Neutestamenliche Abhandlungen 9. Münster, 1922.

Jones, Jeremiah.  A New and Full Method of Settling the Canonical Authority of the New TestamentLondon 1726 (repr.: London 1824).

Nicolas, M. Études sur les évangiles apocryphesParis 1866.

Pick, B. The Extra-Canonical Life of Christ, Being a Record of the Acts and Sayings of Jesus of Nazareth Drawn from Uninspired Sources. New York 1903.

Stowe, C. E. Origin and History of the Books of the Bible, Both the Canonical and the ApocryphalHartford, Conn.: Hartford Publishing Company, 1868.


III. Estudos e edições de textos específicos
* Abbeloos, Jean Baptiste. Acta Sancti Maris.Leipzig 1885.

Budge, E.A. Wallis, ed. and trans., The History of the Blessed Virgin Mary and the History of the Likeness of Christ, 2 vol. London 1899.

Cotteri

* De Lagarde, Paul. Didascalia apostolorum syriace. Leipzig 1854.

* Ephraem, Ignatius. Testamentum Domini Nostri Jesu Christi. Mainz 1899.
Genfell, Bernard P and Arthur S. Hunt. Fragment of an Uncanonical Gospel from Oxyrhynchus. Oxford 1908.

* Gibson, Margaret Dunlop. The Didascalia Apostolorum in Syriac. London 1903.



Klostermann, Erich. Apocrypha III: Agrapha, New Oxyrhynchus Logia.Cambridge 1905.

Mahan, W. D., M. McIntosh and T. H. Twyman. The Archko Volume, or The Archeological Writings of the Sanhedrin and Talmuds of the Jews . Philadelphia 1896.

Oppenheim, Gustav ed. and tr. Fabula Josephi asenethae apocrypha e libro syriaco latine versa. Berlin 1886.

* Phillips, George. The Doctrine of Addai, the Apostle. London 1876.

Taylor, Charles. The Oxyrhynchus Logia and the Apocryphal GospelsOxford 1899.